A figura do hiper suficiente, introduzida pelo art. 444, parágrafo único, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) , redefiniu o equilíbrio contratual entre empregado e empresa, especialmente no nível estratégico do C-Level.
A possibilidade de afastar executivos de alto escalão das regras gerais de reajuste salarial, até então amparadas em normas coletivas, não é mera extravagância hermenêutica, mas sim um passo coerente em direção à modernização das relações de trabalho.
A legitimidade jurídica dessa flexibilização repousa sobre sólidos pilares. O art. 611-A da CLT, ao privilegiar a negociação coletiva sobre a legislação, compõe um quadro normativo que, associado ao entendimento do Supremo Tribunal Federal no Tema 1046 (RE nº 1025.404/SE), chancela a modulação de direitos trabalhistas não consagrados constitucionalmente.
Trata-se, portanto, de uma evolução teleológica do Direito do Trabalho, afinada com as reflexões de eminentes juristas brasileiros, como Arnaldo Süssekind, que já apontava para a necessidade de ajustar a tutela trabalhista às novas dinâmicas sociais.
Nesse contexto, a defesa da autonomia negocial individual para o C-Level não afronta a lógica originária do Direito do Trabalho, concebida para proteger o empregado hipossuficiente.
Ao contrário, a exceção está justamente na condição do alto executivo, cujas competências técnicas, formação acadêmica e capacidade de influir diretamente nos rumos da companhia desmontam o estereótipo da vulnerabilidade. Esse raciocínio acompanha a visão de Amauri Mascaro Nascimento, para quem a legislação trabalhista deve dialogar com os diferentes perfis de trabalhadores, reconhecendo que nem todos se encontram na mesma posição de dependência e fragilidade.
A flexibilidade aqui não significa precarização, mas adequação. O C-Level atua como um parceiro estratégico da empresa, apto a negociar, avaliar riscos e projetar cenários, sendo capaz de instituir critérios meritocráticos e metas claras.
Essa lógica ressoa com o pensamento de economistas como Joseph Schumpeter, que ressaltava a importância da inovação e da adaptabilidade no desenvolvimento econômico, e Gary Becker, cujo enfoque na valorização do capital humano justifica a adoção de políticas salariais diferenciadas para profissionais cujo conhecimento e expertise agregam valor extraordinário ao negócio.
A exclusão do C-Level dos reajustes lineares, além de legitimada pela inteligência legislativa e jurisprudencial, aproxima o Brasil das melhores práticas de governança corporativa internacional.
Na esfera econômica, a remuneração diferenciada por desempenho já é consolidada em mercados maduros, nos quais executivos negociam de igual para igual com as empresas, conforme as peculiaridades do empreendimento. A aplicação desse modelo no cenário nacional fortalece a competitividade, incentiva a produtividade e assegura que a política remuneratória seja orientada por resultados, não por automatismos coletivos.
O caminho, contudo, exige prudência. É imprescindível conferir transparência aos critérios de remuneração, documentar as métricas de desempenho, dialogar internamente e manter boa-fé nas negociações. Essas precauções garantem a legitimidade social do modelo, reduzindo o risco de contestação judicial e consolidando um ambiente propício à meritocracia.
Em suma, a flexibilização do reajuste salarial coletivo para o C-Level, longe de representar uma ruptura arbitrária, encarna o amadurecimento do Direito do Trabalho frente às demandas do século XXI.
Ao reconhecer a hipersuficiência do alto executivo, o ordenamento jurídico cria condições para uma negociação mais livre, inteligente e funcional, na qual a proteção essencial ao trabalhador continua a ser preservada, mas agora modulada pela consciência de que o panorama atual exige, mais do que nunca, inovação e adaptabilidade.